Acad. Noélio Duarte (Cadeira 13)
Com muito pesar, li uma reportagem publicada em um jornal baiano ‘online’ que estampava em grandes letras a reportagem: “Pastor evangélico morre por suicidou”. A notícia caiu como uma bomba sobre a minha cabeça. Eu não o conhecia. Mas foi como se tivesse perdido um grande amigo.
E me reportei ao tempo em que estudei em um seminário teológico ao lado de muitos colegas. Gente alegre, interessante, motivada e compromissada com a missão. Eram muitos amigos na turma de graduação em teologia. Mais tarde, convivi com outras pessoas, dessa vez em uma pós-gradução, cursando a especialização em ministério pastoral. O tempo de convivência nos fez mais irmãos do que amigos. E ali compartilhávamos nossos sonhos, medos, frustrações, indignações e realizações. Tive o privilégio de ir a vários concílios onde colegas eram submetidos a exames presenciais e assim investidos na ordenação ministerial. Muitos destes amigos, hoje são pastores, missionários, professores, escritores, evangelistas, treinadores de equipes, executivos de organizações evangélicas e outros estão apenas vivendo a vida cristã da maneira que imaginam que podem vivê-la.
É muito interessante notar que a maior parte de nós se tornou “cuidador” de pessoas, dedicando nossas vidas em ajudar o “outro”. O ministério, quer seja pastoral, educacional, diaconal, musical, evangelístico, está diretamente relacionado a cuidar de pessoas, quer aconselhando-os, ajudando-as, curando-as e direcionando-as. É uma atividade intensa, desgastante, envolvente, mas profundamente recompensadora. Mas, ser “cuidador” requer muita doação de atenção, tempo e até recursos diversos. Requer a coragem e quem sabe a humildade de se olhar como um ser que também precisa de cuidado de outros “cuidadores” que estejam dispostos a ouvir sem prejulgamentos nossas crises, medos, angústias, desapontamentos, decepções ou sucesso nos empreendimentos.
Ser cuidados é se doar de forma intensa, continua e total. Sem reservas. Doar é dar sem esperar retorno. Não é troca. É simplesmente dar. E num mundo hedonista, capitalista e consumista, viver esse tipo de vida é viver a incompreensão. Não raramente, nós, pastores, ouvimos: “Mas por que você escolheu essa vida? Com seu talento eu estaria fazendo algo de grande porte...” Ou mais: “O que você espera em troca de tanta doação? Esse povo só sabe dar as costas e praticar a ingratidão...”. Não ouvimos com frequência: “Parabéns, você escolheu a melhor parte, vivendo essa vida de sacrifício...”. Ministério rima com cemitério...
A notícia do suicídio daquele pastor foi como se eu tivesse perdido um grande amigo. Eu não o conheci. Mas eu senti a dor de quem perde um amigo. Ele era um pastor! E imediatamente a minha mente foi invadida por centenas de pergunta do tipo: O que o levou a fazer isso? Por que ele fez isso? O que afligia seu coração naquele momento? Como vivia com a sua família? E a sua vida, como era? Com quem ele conversava abria o seu coração diante da dor, decepção, tristeza e frustrações? Como era a sua igreja? Que projetos estava realizando? Ou mesmo, quais os projetos que o decepcionavam? Provavelmente, respostas que nunca terei porque quem as conhecia se foi.
E foi então que me vi chorando porque é difícil de acreditar que um pastor, querido daquela igreja, aparentemente tão feliz, tenha entrado em tamanho desespero! Porém, choro por muitos amigos e amigas que sei que também sofrem com a depressão. Choro porque alguns encontram-se tão desesperados, mas ainda escutam dos outros que é depressão é doença de gente fraca, de espiritualidade duvidosa.
Choro porque a depressão tem atingido nossas igrejas, nossas escolas, nossos lares e nossa Sociedade. Choro porque ela não é uma doença visível e facilmente detectável, mas age mais cruelmente que o câncer, espalhando-se e destruindo a vida através da desesperança.
E ao enxugar as minhas lágrimas, vieram outras contundentes perguntas: Quem cuida do cuidador? As nossas igrejas, nossos seminários, nossas juntas, nossas ordem pastorais... Quem? E olhei a minha realidade, lembrei-me de situações passadas em que tive que vivê-las sozinho porque o pastor é um ser humano sozinho. Vive sozinho suas agruras, suas conquistas e também seus calvários. Afinal, quem é o pastor do pastor?
E vivenciando situações solitariamente, sofrendo sozinho, tomei uma decisão: Todo pastor precisa de um pastor. E fui procurar um. Achei-o e dou graças a Deus por isso.
Mas surgiu a pergunta: Por que pastores não têm seus pastores? Não posso responder, mas arrisco-me a afirmar que a vaidade, o orgulho, a arrogância, a prepotência ou o medo de desnudar sua vida diante do outro, tem levado ministros a desenvolveram doenças psicossomáticas e até mesmo doenças crônicas levando-os a uma morte prematura. A história evangélica recente mostra-nos vidas pastorais que se foram antes do tempo, precocemente, prematuramente. E novamente pergunto: Por que se foram tão cedo? E até me arrisco a perguntar: Quem cuidava daqueles cuidadores? Quem era seus pastores? Parece que essa não é uma cultura ainda reinante entre nós. Mas que todo pastor precisa de um pastor, ah, precisa sim! E não estou falando a respeito do supremo pastor de nossas almas, Jesus Cristo. Estou falando de gente que gosta de ouvir e cuidar de gente. Gente especial, visionária, ajudadoa.
Precisamos aprender a cuidar de quem cuida de nós, lembrando-nos que são tão humanos quanto a gente: pastores, padres, psicólogos, psiquiatras, professores… e pais.
Já passou da hora de aprendermos a cuidar de quem cuida.
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